Dilma, o futuro a
absolverá
Certos heróis nascem de incríveis atos de coragem em
momentos de extrema dificuldade
Logo na
primeira troca de faixas, esse projeto que duraria “mil anos” começou a
encontrar dificuldades estruturais marcantes. Dilma não seguiu à risca a
cartilha do lulista. O incentivo à busca do consenso, o meio termo, os passos
calculados e a eterna ampliação da base aliada não era o que Dilma tinha em
mente. O início fulminante do Governo, com aprovação nas alturas e com Dilma,
mãe do povo, na verdade era o fim do lulismo. O fim de um projeto que funcionou
bem por oito anos, mas não tinha fôlego para ser eterno.
O dilmismo entrou em cena no fim de 2012, início de 2013, embora
o povo só tenha tomado conhecimento desse novo modelo de Governo em junho de
2013, quando as
manifestações explodiram país afora. A partir daí o dilmismo
enraizou-se sem se alterar, sem abrir o mínimo espaço para o lulismo nos anos
seguintes.
Esse
conflito de pseudo-ideologias viveu uma trégua durante aseleições de 2014. Afinal, ainda havia para o
ex-presidente Lula a chance de mudar a forma de atuar de sua pupila, enquanto
para Dilma havia a esperança de convencer o mentor de que, no momento, o seu
modelo é mais moderno e adequado para o Brasil.
Não foi o
que ocorreu. Desde sua vitória apertada
nas urnas, o dilmismo morreu, e em um ato imprescendente, arrastou
junto o lulismo. Dilma, sem saber, está sendo a Margaret Thatcher brasileira.
Por meio
de seus erros, seus equívocos, o Brasil está adotando uma mentalidade diferente
da que reinou nos últimos anos. O desejo de diminuir o Estado, seja por meio do corte de
ministérios ou
demissão de cargos comissionados, não existe só entre a elite empresarial de
São Paulo. Já se tornou um desejo nacional, onde brasileiros estão entendendo
que eficiência é o que garante comida na mesa. Desburocratização, menos
impostos e excelência são demandas que se ampliam entre várias camadas sociais.
Dilma está
promovendo uma mudança de mentalidade na imprensa, em formadores de opinião e
no meio político sem precedentes. Por conta dela e do PT, o maior partido de esquerda
do país irá encolher
nas próximas eleições. O Congresso tornou-se mais conservador do que foi em
muitas décadas. À beira do abismo, o PT pode abrir espaço para o PMDB e o PSDB
se transformem em dois gigantes, e o possível herói que pode salvar o Governo
dito de esquerda ser um economista da Escola de Chicago. Não esqueçamos de que
um mamute, como a Petrobras, que sairá magra, eficiente, bonita e ágil quando
tudo isso passar e seus parasitas forem eliminados.
Ora, nem
que quisesse, Dilma promoveria tantas mudanças que empurrariam o Brasil para
um ambiente tão liberal quanto o que está se formando. Seus erros e os do PT
chegaram a tal ponto que a criação do Partido Novo, de orientação liberal, está
sendo saudada por várias fatias da sociedade como um sopro de novidade em um
ambiente político débil e repetitivo.
Certos
heróis nascem de incríveis atos de coragem em momentos de extrema dificuldade.
Outros só são reconhecidos anos, décadas depois de sua existência, simplesmente
por terem sido catalisadoras de grandes e inesperadas mudanças. Dilma pode
muito bem ser a heroína do país no futuro, não pela forma consciente com a qual
governou, mas pela revolução que seus erros terão gerado. Não vaiem agora. No
futuro, poderemos estar aplaudindo.
Thiago
Aragão é sócio da
consultoria de análise política Arko Advice.
Fonte: El País
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